É normal pensar que se somos fluentes numa língua, ou seja, se conseguimos manter uma conversa com amigos e colegas; compreendemos mais ou menos um filme, um livro, um artigo de jornal; escrevemos e-mails e outra documentação relacionada com os estudos ou o trabalho, então deveríamos ser capazes de passar num exame concebido para testar os nossos conhecimentos de língua, como os exame do Centro de Avaliação de Português Língua Estrangeira (CAPLE). Infelizmente, as coisas não são bem assim e, por vezes, este pressuposto pode levar a um excesso de confiança, resultando numa preparação inadequada e em resultados decepcionantes.

Os exames de certificação linguística não avaliam a capacidade dos aprendentes de usar a língua num contexto real, mas sim outras competências muito específicas. Essa avaliação é feita em condições especiais que podem ou não ser ideais. Uma sala ruidosa vai certamente dificultar ainda mais a compreensão do oral e será bastante mais fácil realizar a prova de produção e interação oral se os examinadores forem simpáticos e compreensivos).

Os exames CAPLE, tal como outros exames de certificação linguística, têm como objetivo testar as capacidades de compreensão auditiva, leitura, escrita e expressão oral dos aprendentes, mas a forma como o fazem nem sempre reflete o modo como os falantes usam a língua no mundo real. Um exemplo óbvio desta discrepância é o tipo de perguntas utilizadas. Quando foi a última vez que fez um exame com perguntas de escolha múltipla (PEM)? Talvez se mora nos Estados Unidos esteja bastante habituado a responder a este tipo de perguntas, mas se vive em Espanha, França, Alemanha ou Irlanda, a última vez que fez um teste deste tipo foi, muito provavelmente, para tirar a carta de condução ou fazer algum exame no liceu ou faculdade. Acrescente-se que elaborar uma boa PEM é tão difícil que, por vezes, até os falantes nativos têm dificuldade em encontrar a resposta correta (ou melhor dizendo, aquela que o examinador decidiu ser a correta). No entanto, a grande maioria de perguntas feitas nos exames CAPLE usa este tipo de pergunta e é, portanto, essencial preparar estratégias para as saber responder. A preparação para um exame de certificação exige mais do que conhecer a língua ou estudá-la, é necessário “treinar” as condições específicas do exame, bem como para o tipo de competências e ferramentas adicionais que este exige.

As secções mais difíceis de um exame de certificação linguística variam em função dos pontos fortes e fracos de cada candidato. Todavia, certas secções são geralmente consideradas mais desafiadoras do que outras, não necessariamente devido à complexidade das competências que avaliam, mas antes às limitações de tempo dado para as completar, e às competências não linguísticas que exigem, como a capacidade de selecionar uma entre uma lista de opções muito semelhantes de resposta ou de passar rapidamente de uma estratégia de leitura para outra. Começamos por falar na Compreensão do Oral já que muitos candidatos acham que é a parte mais difícil dos exames CAPLE. Esta seção exige que os estudantes compreendam monólogos ou diálogos reais ou simulados proferidos por falantes nativos com diferentes sotaques a diferentes velocidades de elocução. O nível de complexidade dos textos é variado e nem sempre se apresentam do mais fácil para o mais difícil. Sotaques desconhecidos, ruído de fundo ou mesmo uma má gravação podem complicar ainda mais esta secção e nada da vida real dos estudantes os preparará para esta secção do exame (a não ser que peçam emprestada a capa invisível do Harry Potter e se passeiem de mesa em mesa num café ou de banco em banco num comboio a ouvir as conversas de outras pessoas e, mesmo assim, poderão não ter acesso a uma gama tão variada de tópicos, acentos e velocidades discursivas. Além disso, devido às limitações de tempo, os estudantes têm de ouvir enquanto leem as perguntas e as três ou quatro opções de resposta. O desafio desta secção consiste em processar rapidamente a informação, discernir os pormenores essenciais e, por vezes, inferir o significado a partir do contexto, sob pressão de tempo. Os candidatos têm de ler, ouvir, decidir rapidamente, voltar a ouvir, confirmar a resposta que escolheram (esperemos que sem qualquer sombra de dúvida) e passar a um tema novo sem qualquer relação com o anterior, com oradores diferentes e repetir o processo cinco a oito vezes, dependendo do nível do exame. Tendo em conta que nada na sua vida quotidiana os prepara para este exercício, a prática de exames simulados ou de exercícios de compreensão oral ajudá-los-á a melhorar a sua capacidade de ler e decidir rapidamente enquanto ouvem e a desenvolver a habilidade de alternar entre temas, velocidades e sotaques dos oradores, sem pestanejar.

Poderíamos pensar que, se conseguimos manter uma conversa com um desconhecido, seremos capazes de passar sem qualquer dificuldade na Produção e Interação Oral. No entanto, é improvável que um desconhecido o deixe tão nervoso como o/a examinador/a. Falar com estranhos nunca é uma tarefa fácil e ainda menos quando um deles nem sequer é um falante nativo. Estas são as principais dificuldades colocadas por esta seção e, mais uma vez, nada como praticar os exercícios que a compõem para melhorar os seu desempenho.

A secção Compreensão da Leitura testa a capacidade de apreender e analisar rapidamente conteúdos escritos, que podem incluir textos complexos, linguagem técnica e conceitos abstratos. O desafio não consiste apenas em compreender o vocabulário e a gramática, mas também, em níveis mais avançados, em interpretar a intenção e até o tom do/a autor/a. Nos exames A2 e B1, os estudantes têm de responder a perguntas que avaliam a sua compreensão global de mensagens e textos curtos, enquanto nos certificados B2, C1 e C2 apresentam vários extratos ou textos mais extensos com vocabulário exigente que exigem uma compreensão ao mesmo tempo global e detalhada. Não é o mesmo ler e compreender um texto que ler um texto e responder às perguntas de interpretação (de escolha múltipla) que lhe estão associadas. Os candidatos têm de inferir a opção correta com base na informação recolhida no texto e apesar de em algumas perguntas essa relação ser óbvia em muitas outras é necessário fazer um trabalho de exclusão e/ou dedução. Treinar estas capacidades nada tem que ver com saber ou não saber a língua e pode ser melhorada com a prática.

Por último, mas não menos importante, vem a secção de Produção e Interação Escrita, que exige que os candidatos produzam ensaios ou respostas coerentes e bem estruturadas, dentro de um período de tempo definido e, ao contrário do que aconteceria na vida real, sem qualquer apoio ou ferramenta. Nos exames dos níveis mais elevados, esta secção desafia os candidatos a demonstrar a sua capacidade de organizar as ideias, utilizar a gramática e o vocabulário adequados e transmitir os seus argumentos de forma clara e persuasiva e apesar da complexidade dessas exigências é levada a cabo sob o efeito do cansaço causado pela resposta à(s) secção(ões) anteriores do exame. Esta seção exige também conhecimentos de redação de textos específicos. No CIPLE e no DEPLE, os candidatos podem ter de escrever um convite formal ou informal ou descrever um acontecimento no passado (para demonstrar que sabem usar o pretérito perfeito). Aos candidatos de nível B2 e superiores (DIPLE, DAPLE e DUPLE) é-lhes pedido que redijam ensaios argumentativos ou expositivos, cartas de reclamação ou de pedido. Se os estudantes não tiverem muitos amigos ou colegas portugueses a quem enviar convites, se não forem estudantes universitários habituados a escrever ensaios ou se não forem utilizadores frequentes do “Livro de Reclamações”, então aconselhamos vivamente que se familiarizem com o modo de redação deste tipo de textos.

Resumindo, os/as aprendentes que desejem obter um bom resultado no exame de certificação de português devem desenvolver outras competências muito para além da proficiência linguística, incluindo a capacidade de ouvir em circunstâncias muito especiais, de interpretar textos e, mais importante ainda, as perguntas e respetivas opções de resposta, de redigir textos específicos e de melhorar a sua oratória. Uma vez dominada a língua, é necessário concentrar-se no desenvolvimento de estratégias para a realização dos testes. Frequentar um curso de preparação que ofereça testes práticos ajudá-los-á certamente a melhorar a sua pontuação mas, sobretudo, a facilidade com que se apresentarão ao exame pois realizar o maior número possível de exercícios semelhantes ao exame ao qual se estão a candidatar permitir-lhes-á experimentar diferentes estratégias de resolução de dificuldades e desse modo encontrar a abordagem que lhes permita não apenas passar mas ter boa nota no exame.

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